segunda-feira, 13 de abril de 2015

A evolução do homem - e ainda o conceito de CULTURA, por Darcy Ribeiro

   Nas nossas próximas aulas, estudaremos sobre os primeiros grupos humanos e veremos que, atualmente, há apenas uma espécie de ser humano habitando o planeta: a nossaHomo sapiensMas já houve outras, algumas que até podem ter convivido entre si (inclusive com a nossa), porém todas já extintas, exceto a nossa, claro. 

   Além do Homo sapiens, existiram outros hominídeos (primatas semelhantes ao ser humano). O primeiro hominídeo bípede conhecido é o Australopithecus (surgiu há cerca de 5,5 milhões de anos). Depois deles surgiram hominídeos do gênero Homo, isto é, com capacidade para fabricar utensílios e  articular uma linguagem e se comunicar

   Podemos dizer, então, que com essas espécies começa a História: 
  • Homo habilis (há cerca de 2,4 milhões de anos); 
  • Homo erectus (há cerca de 1,6 milhão de anos); 
  • Homo neanderthalensis - ou Homo sapiens neanderthalensis...  (há cerca de 200 mil anos) e 
  • Homo sapiens - ou Homo sapiens sapiens... (há cerca de 120 mil anos). 
   É importante reforçar, mais uma vez, que não há prova de evolução direta entre essas espécies. Portanto, uma espécie de Homo não gerou a outra, mas, ao contrário, há evidências de que diferentes espécies de Homo existiram na mesma época, como já disse acima e na folha desta semana.  

   Além disso, desde o momento em que passaram a confeccionar instrumentos e a desenvolver uma linguagem articulada, as espécies dentro do gênero Homo se distinguiram das demais e criaram o mundo da cultura. Principalmente quanto à nossa espécie, Homo sapiens, transformar a natureza e a si próprio por meio do trabalho passou a ser a sua principal característica. A partir de então, a evolução biológica ocorre simultaneamente à evolução cultural. E a nossa capacidade de produzir cultura se deve tanto às características físicas que adquirimos com a evolução biológica quanto às próprias heranças culturais que recebemos de nossos antepassados.

   Bom, já que estamos falando de cultura, que tal entender melhor esse conceito? Para isso, nada melhor que um texto do antropólogo Darcy Ribeiro feito especialmente para pessoas da sua idade. Que tal?


     CULTURA 

   Além dos seres vivos e da matéria cósmica, existem, também, coisas culturais, muitíssimo mais complicadas. Chama-se cultura tudo o que é feito pelos homens, ou resulta do trabalho deles e de seus pensamentos. Por exemplo, uma cadeira está na cara que é cultural porque foi feita por alguém. Mesmo o banquinho mais vagabundo, que mal se põe em pé, é uma coisa cultural. É cultura, também, porque feita pelos homens, uma galinha. Sem a intervenção humana, que criou os bichos domésticos, as galinhas, as vacas, os porcos, os cabritos e as cabras não existiriam. Só haveria animais selvagens. 
   A minhoca criada para produzir humo é cultural, eu compreendo. Mas a lombriga que você tem na barriga é apenas um ser biológico. Ou será, ela também, um ser cultural? Cultural não é, porque ninguém cria lombrigas. Elas é que se criam e se reproduzem nas suas tripas. 
   Uma casa qualquer, ainda que material, é claramente um produto cultural, porque é feita pelos homens. A mesma coisa se pode dizer de um prato de sopa, de um picolé ou de um diário. Mas essas são coisas de cultura material, que se pode ver, medir, pesar. 
   Há, também, para complicar, as coisas da cultura imaterial, impropriamente chamadas de espiritual – muitíssimo mais complicadas. 
   A fala, por exemplo, que se revela quando a gente conversa, e que existe independentemente de qualquer boca falante, é criação cultural. Aliás, a mais importante. Sem a fala, os homens seriam uns macacos, porque não poderiam se entender uns com os outros, para acumular conhecimento e mudar o mundo como temos mudado. A fala está aí, onde existe gente, para qualquer um aprender. Aprende-se, geralmente, a da mãe. Se ela é uma índia, aprende-se a falar a fala dos índios, dos Xavantes, por exemplo. Se ela é uma carioca, professora, moradora da Tijuca, a gente aprende aquele português lá dos tijucanos. Mas, se você trocar a filhinha da índia pela filhinha da professora e criá-la, bem ali, na praça Saens Peña, ela vai crescer como uma menina qualquer, tijucana, dali mesmo. E vice-versa, o mesmo ocorre se a filha da professora for levada para a aldeia Xavante: ela vai crescer lá, como uma xavantinha perfeita – falando a língua dos Xavantes e xavanteando muito bem, sem nem saber que há tijucanos. 
   Além da fala, temos as crenças, as artes, que são criações culturais, porque inventadas pelos homens e transmitidas uns aos outros através das gerações. Elas se tornam visíveis, se manifestam, através de criações artísticas, ou de ritos e práticas – o batizado, o casamento, a missa – em que a gente vê os conceitos e as ideias religiosas ou artísticas se realizarem. Essa separação, de coisas cósmicas, coisas vivas, coisas culturais, ajuda a gente de alguma forma? Sei não. Se não ajuda, diverte. É melhor que decorar um dicionário, ou aprender datas. Você não acha? 

(RIBEIRO, Darcy. Noções de coisas. São Paulo: FTD, 2000. p. 34.)

Darcy Ribeiro (1922-1997) 
Antropólogo, escritor e político brasileiro, 
conhecido por seu foco em relação aos índios e à educação no país


Imagem: revistaforum.com.br 

9 comentários:

  1. Matéria meio complicada :\
    Mas da pra ver que vai ser bem legal e interessante!

    Amanda Beck 606

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  2. Ih, Amanda, parece, mas não é... Tenho certeza de que você vai adorar!

    Beijos!

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  3. Nossa...esse texto fala a nossa lingua! Nem parece aqueles negócios de decoreba que as professoras mandavam decorar né prof Alessandra? ;)
    Julia Coli 606

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  4. Adorei, esse texto me ajudou bastante a entender a matéria. Você está de parabéns ;-)


    Ana Beatriz P. Turma: 604

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  5. Nossa Parece muito difícil mas por ler o texto deve ser ótimo para entendermos a fase humana
    João Victor 606

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  6. Nada a ver com decoreba, né, Julia? Esse texto é sob medida para vocês!

    Beijos!

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  7. Bom que gostaram, Ana Beatriz e João Victor!

    Beijos para vocês!

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